Eles passarão, eu passarinho
Às vezes, precisamos silenciar algumas vozes para seguirmos adiante.
Comecei essa newsletter como um canal de novidades. Depois, transformei em um espaço seguro onde podia soltar a minha voz. Como sou escritora e imaginei que esse fosse um lugar de escrita, decidi falar sobre o mercado literário.
Mas o mercado literário é amplo, barulhento e tem cheiro de esterco.
Quero ser uma autora antenada, sempre por dentro das novidades e entender essa vastidão para poder desbravá-la, mas isso tem um custo muito alto: a presença constante nas redes sociais, como se escrever e publicar livros obrigatoriamente passasse pelo gargalo da exposição pública desenfreada.
Não que eu me importe muito em me expor. Todo mundo sabe que sou extrovertida e adoro um microfone. Mas não é só botar a cara na frente - a gente acaba bombardeada e nem sempre sobrevive.
Hoje eu fiquei um bocado no twitter e no instagram. Quis postar sobre Harvard sendo resistência contra o absurdo de não poder matricular estrangeiros. Quis postar sobre nosso governo sendo exatamente o que eu não esperava dele e as esperanças de quem também não esperava naufragando ao descobrir que, no fundo, só se governa na rico por aqui. Quis gritar, me esgoelar, porque ninguém se importa com a natureza. E, por fim, arrumei confusão em comentário do instagram porque um monte de homens estava arrumando desculpas para homem que mentiu sobre uma vasectomia e homem que disse, em plenário, que mulher gosta de apanhar.
Viram? É exaustivo. Não tem a ver com o mercado literário, mas, e quando tem? E quando o que nos exaure é a cobrança descabida por uma diversidade racial e étnica que ninguém quer ler? Quando vemos editoras e público empurrando livros LGBTQIAPN+ para o fundo das prateleiras, ou autoras pretas escrevendo personagens brancos e padrão porque só isso vende nas capas dos romances? Ou quando a conversa do pirateamento ultrapassa o bom senso e você vê seu trabalho sendo desvalorizado a ponto de quase te fazer desistir? Ou, ainda, quando um universo de “tretas literárias” te faz pensar que ninguém se importa com histórias e que “ler livros” virou uma trend entre pessoas que disputam quem lê mais e no final não entende nada.
Sem contar que livro virou história em quadrinho e você só vende se fizer mil ilustrações, oferecer mil links de resgate, entrar em todo tipo de promoção kamikaze e gastar todo dinheiro que você não tem para burlar um sistema que foi feito para ser burlado.
Bem.
Isso suga a criatividade de qualquer autora. As redes sociais são ambientes muito legais para nos comunicarmos com nosso público, mas também são inóspitas e agressivas. Encontramos o pior das pessoas por lá.
Mídias sociais representam um estágio de atrofia do social
Han Byung Chul - A Expulsão do Outro (p. 10)
Enquanto a gente precisa (e deve) estar lá, mas não pode ser sugada para o moedor de carne de um mercado agressivo, que pouco se importa com a arte em si, entendi que será necessário filtrar tanto os momentos com que apareço quanto os assuntos com que me relaciono. Por mais que eu queria e vá continuar “me inteirando” do mercado, não quero mais me aprofundar no universo de escritoras que acham muito tendência escrever um romance em que o mocinho (?) pratica aliciamento sexual e que coloca a mulher na posição de sedutora, como se ela fosse a “culpada” pelo homem predador.
Não dá mais para mim.
Minhas newsletters, a partir de semana que vem, focarão nos meus estudos, no meu processo de escrita, no que estou descobrindo de bom por aí, no que pode contribuir para o mercado literário onde eu quero estar. Continuarão quinzenais e muito divertidas, mas não vamos mais “tretar” por aqui. Falaremos de coisas positivas, de estudos, estrutura, recomendações de boas leituras e de arte.
Continuem comigo. Só a união muda qualquer coisa.
Beijo grande e até lá.
Colocações perfeitas!
Eu entendo perfeitamente o sentimento, sinto muito mas entendo. Eu mesma leio e observo certas coisas nas redes e deixo passar pq não vale a pena discutir com gente que não raciocina. Nem para instigar uma simples ideia… não tem solo (neurônio) fértil.